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quinta-feira, 25 de março de 2010

Sinal da presença do Senhor

Uma idéia fundamental do Concílio Vaticano II é ser a Igreja o Povo de Deus. Perpassa todos os documentos como um alicerce sobre o qual se edifica a obra extraordinária de renovação conciliar.
Aí encontram-se as raízes de toda uma formação comunitária nos mais variados ângulos da vida eclesial. Percebe-se essa presença na Liturgia, com a maior participação dos fiéis; no governo diocesano e no paroquial, com os Conselhos, mesmo quando apenas consultivos; no esforço ecumênico, para suprimir as distâncias que dilaceraram, no correr dos séculos, o Corpo Místico de Cristo. E assim por diante.
Concomitantemente, o conceito de pessoa é valorizado. Como exemplo, o Documento “Dignitatis Humanae” proclama o respeito à opção religiosa de cada indivíduo.
Dadas as limitações de nossa inteligência e as deficiências introduzidas pelo pecado, a aplicação de diretrizes à realidade sofre desvios. A rota fixada com freqüência exige retificação para que alcancemos o que nos é proposto.
No decorrer da história, em algumas épocas recrudesce um individualismo; entre outros, se insiste em um coletivismo. Sabemos de países nos quais as etnias são mais fortes que as fronteiras estabelecidas pelos colonizadores.
Entre nós, os exercícios religiosos vêm passando de algo privado e particular para uma vivência mais comunitária.
Como em toda transição, há sombras na prática do novo estilo. Assim, ao formar-se um grupo, devemos estar atentos para o perigo de reduzir os direitos de seus componentes. Faz-se mister um exame acurado das diretrizes conciliares tendentes a abrir com fidelidade ao Vaticano II nosso universo tradicionalmente fechado. Na liturgia, na catequese, nas atividades apostólicas em geral procura-se inculcar esse espírito.
Normalmente, os resultados obtidos são animadores e os riscos de invadirem a legítima privacidade, mínimos. O problema surge quando se faz necessária uma decisão que atinge atitudes externas dos membros e não apenas o contato com o Senhor. A alteração das normas da convivência com os homens é o terreno no qual se impõe um desvelo especial para que no agir sejam preservados os direitos da pessoa humana.
A comunidade autenticamente constituída é fonte e salvaguarda da riqueza de cada membro, não um condicionador espúrio forçando a decisão a ser tomada ou fator que limita, restringe ou desrespeita a nobreza inerente aos filhos de Deus. Jamais um grupo terá o direito de induzir um de seus integrantes a abrir mão de opção feita conforme a própria consciência. Quando isto ocorre, há perigo iminente.
Um pequeno ou grande agrupamento de cidadãos resguarda cuidadosamente o privilégio de discordar, sem criar constrangimento para ninguém. O contrário é aberração e atinge especialmente os mais fracos. E, por vezes, tal é a pressão que somente uma energia invulgar a ela resiste.
Hoje em dia, há estudos que indicam a capacidade de uma restrita minoria dominar toda uma coletividade no meio profano. O resultado majoritário pode revelar apenas decisão de poucos.
Por isto, à medida que se estimula a vida comunitária, necessitamos criar condições que garantam a legítima autonomia de cada pessoa.
Acresce que os cristãos estão inseridos em uma sociedade que é condicionada, em parte considerável, pela opinião pública. Este aspecto é bem mais grave, pois a manipulação é realizada por indivíduos às vezes contrários à obra de Cristo e com objetivos alheios ao bem das almas. A covardia e a submissão às correntes de pensamento em voga vêm a ser característica dos tempos atuais. Em vez de se perguntar qual a escolha melhor a adotar ou votação a dar, prefere-se indagar sobre o que dirão os outros a respeito da atitude que se vai tomar. Substitui-se a dignidade da pessoa pela prepotência de poucos.
Com que habilidade, por exemplo, pretendeu-se identificar a Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé com o Santo Ofício, termo carregado de lembranças negativas, embora perfeitamente defensáveis em outras épocas. Um simples e natural procedimento – ouvir antes de decidir – é apregoado como prévia condenação. Tudo isto por amor a Jesus ou a favor de causas inteiramente à margem do Evangelho?
O vigor da comunidade e respeito à pessoa são os pontos cardeais que nos devem nortear.
Muito a propósito a reflexão do grande pensador católico Jean Guitton. Observava ele que, a partir da primeira guerra mundial, foi tomando vulto a noção de “comunidade” ou de “corpo social”, tanto fora como dentro da Igreja. Por certo, esta revalorização do fato de que nascemos e estamos inseridos num conjunto social foi de proveito para todos, pois aguçou a consciência da responsabilidade que pesa sobre cada homem. E acrescenta – muito sabiamente – que tal ocorrência não nos deveria levar a um coletivismo despersonalizante: a comunidade me ajuda a caminhar; ela me acompanha até a hora da morte. Contudo, quem comparece diante de Deus, sou eu só; há em mim algo que não se identifica com os outros; e por eles deve ser respeitado.
Com paciente e persistente esforço, será alcançado o objetivo que enobrece a atividade pastoral e preserva o valor de cada componente. Somente assim brilhará a verdadeira unidade, sinal da presença do Senhor.

FONTE: Arquiocese do Rio de Janeiro/RJ

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