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quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

A moda dos consultórios espirituais que prometem curar doenças

Consultas espirituais na região de Rio Preto atraem uma média de 4,7 mil pessoas por mês com promessas de expulsão de encostos (espíritos do mal) e cura para doenças como câncer, paralisia e até aids. Para isso, os curandeiros burlam a lei e chegam a colocar em risco a saúde dos doentes - um deles está na mira da Vigilância Sanitária por exercício ilegal da medicina.
Dos três que apregoam curas milagrosas no noroeste paulista, dois cobram taxa, com o argumento de que o valor serve para custear os insumos usados. Em Votuporanga, Edelarzil Munhoz Cardoso, que diz extirpar tumores e o vírus da aids ao retirar sangue e objetos de montes de algodão, pede R$ 14 dos peregrinos, enquanto Milton Mariotti cobra R$ 10 de quem se dispõe a fazer um pequeno corte na orelha para sarar de problemas na coluna.
Somado, o faturamento bruto de ambos chega a R$ 47 mil por mês. João Gotardo, que diz incorporar o espírito de um médico alemão, não cobra dos pacientes. Mariotti, um afiador de tesouras e alicates de unha, começou com suas “cirurgias” há 34 anos. Na época, o irmão sofria de graves dores nas costas. “Um dia, amanheci com a ideia de fazer um corte na orelha dele”, diz. Em 30 dias, segundo ele, o irmão estava curado.
A notícia se espalhou rapidamente, e a casa de Mariotti, em Votuporanga, tornou-se um centro de peregrinação de doentes de todo o País e até do exterior. Por mês, cerca de 500 homens, mulheres e crianças são “operados” pelo afiador de tesouras. “Há dois meses, vieram dois homens do Marrocos. Depois soube por parentes no Brasil que tinham se curado.” No ano passado, a Vigilância Sanitária fez blitz e apreendeu os objetos utilizados pelo curandeiro. Mariotti foi proibido de fazer novos procedimentos.
“É exercício ilegal da medicina, o que é crime”, diz a diretora da Vigilância de Votuporanga, Nely Fernandes Droveto de Oliveira. “Esse senhor expõe as pessoas a risco de infecção, se o material que ele usa para os cortes não for bem esterilizado. Pode haver risco de transmissão de doenças infectocontagiosas, como aids e hepatite.” Apesar dos riscos, Mariotti permanece na ativa, clandestinamente.
No dia 17 deste mês, sem se identificar, a reportagem esteve na casa do afiador de tesouras. Quem atende é uma mulher. No fundo da residência, cinco idosos aguardam. Um deles, João, veio de Santo Anastácio, região de Presidente Prudente, trazer a mulher. “Tinha desvio na coluna e três bicos de papagaio. Nenhum médico me curava. Vim aqui faz três meses e hoje estou bom. ”
Após meia hora de espera, Mariotti chama todos para sua sala, que lembra um consultório médico - paredes brancas, mesa, cadeiras, sem símbolos religiosos. Ele pede para o repórter, que sofre de dores na coluna, sentar-se, e une os polegares com os braços esticados na horizontal e na vertical. Vem o diagnóstico: “Você tem duas protrusões, uma lombar e outra cervical. Vou fazer em uma orelha, e daqui 50 dias você volta para a gente fazer na outra”, diz ao repórter. Em seguida, passa álcool em gel nas mãos, e manda o paciente segurar um pedaço de gelo na orelha para adormecer a pele e aliviar a dor.
Enquanto isso, aquece um bisturi em um fogareiro e diz: “Eu creio em Deus, em Jesus e no sol”. Pede para respirar fundo e faz dois cortes na orelha direita, um deles profundo. Apesar da pele adormecida, a dor incomoda. O borracheiro Paulo Fabiano Pereira, 31 anos, de Guapiaçu, garante que os cortes na orelha o salvaram de um desvio crônico na coluna. “Fiquei dois anos de cama, tomei 36 injeções. Nada adiantava. Só o Milton conseguiu me curar, faz seis anos. Hoje carrego pneu, trabalho normalmente.”
Hassen Saidah, acupunturista da Famerp, diz que a orelha tem pontos de representação de todo o corpo humano. “Ao estimular esses pontos, as agulhas aliviam dores e curam doenças, o que é comprovado pela ciência. Mas cortar esses pontos pode anulá-los.”
Para o Conselho Regional de Medicina (Cremesp), só médicos podem fazer incisões na pele. “Isso é caso de polícia”, diz o presidente regional da entidade, Pedro Teixeira Neto. Segundo a Delegacia Seccional de Votuporanga, não há inquérito para apurar a atividade de Mariotti. Em tempo: as dores nas costas do repórter só pioraram do dia da visita até ontem. A elas, acrescentou-se o incômodo das feridas na orelha.

Fonte: Rainha Maria

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